segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Identidade local: Construção e contradição na cidade

Placa próxima à Estação de Olaria - detalhes em placas no entorno da escola


“Lá em Vila Isabel quem é bacharel não tem medo de bamba
São Paulo dá café, Minas dá leite e a Vila Isabel dá samba”
Noel Rosa

A citação acima é trecho da música feitiço da Vila, de Noel Rosa. Noel utilizava sua arte para criar um enfrentamento  aos que se opunham a seus pontos de vista ou mesmo fazer questionamentos aos que entendiam ser essa ou aquela música de fato melhor que outras, sobretudo aquelas de compositores suburbanos. Tantas outras expressões do pensamento podem também possibilitar que a memória local seja preservada,  sendo trazida aos nossos dias e que até mesmo - por que não? - seja posta como verdade para as gerações futuras.

Nessas minhas andanças me deparei com uma interessante iniciativa que não e nova nem mesmo musical, mas que agrega um valor elevado à identificação das ruas na Cidade do Rio de Janeiro, que é a descrição das figuras que dão nome aos logradouros públicos. É interessante, para início de conversa, tomarmos como referência o que ocorre na Região da Baixada Fluminense onde se aliam dois fatos que contribuem para a falta de identidade local. O primeiro é o baixíssimo investimento na identificação das vias públicas. O segundo é o quase total desconhecimento de aquém se refere um determinado nome de rua.  Aliando esses fatores com os constantes Projetos de Lei que modificam os nomes de logradouros públicos, vemos uma forte contribuição para o esquecimento e a falta de afinidade do morador com seu lugar, sobretudo os mais jovens.
João Pilotto - engenheiro lendário em Mesquita, com nome escrito errado

Edson Show(pandeiro) e Roque(atrás) ruas com seus nomes
Uma iniciativa muito interessante foi a que ocorreu em Mesquita, com o lançamento do Livro Nossas Ruas têm História lançado em 20011, antecedido de eventos realizados nos dois anos anteriores, homenageando respectivamente Romildo Bastos e Ambrósio Barbosa, cada um com uma motivação específica, eventos nos quais participei como pesquisador e produtor. No caso do Romildo, o fator preponderante foi exatamente seu nome como mudança de rua o que motivou tal iniciativa. A Rua Pará no Centro de Mesquita, como era conhecida anteriormente, era o ponto de encontro de sambistas nos anos 80. Muitos bambas do samba por ali passaram, fazendo daquela rua uma referência de cultura local, tendo esse gênero musical como foco. Um dos admiradores e também assíduo seguidor das rodas de samba no local e amigo pessoal de Romildo era o então vereador Rechuem. Através de Projeto do Legislativo esse parlamentar mudou o nome da rua, homenageando o artista, sem discussão alguma com a população local, o que causou indignação na comunidade, não pelo nome que, para muitos, era desconhecido, mas pela falta de interlocução, o que motivou a realização do evento, quando foram mobilizados amigos compositores, amigo moradores e a comunidade em geral em uma grande festa, que trouxe por fim o devido esclarecimento e um entretenimento impagável por conta do verdadeiro chão de estrelas ali presente. 

Rua Ambrósio - Homenagem aos funcionários da  Ludolf
Em relação ao Ambrósio a atividade se deu de uma forma mais tranquila em relação a comunidade do Bairro Vila Emil e mais minuciosa em relação a pesquisa. Sob o ponto de vista do registro em cartório dos loteamentos, ambos os lados do Município  se parecem. As áreas eram registradas já com nome dos logradouros com nomes escolhidos pelos proprietários. No caso do Centro, o trecho em que estava contida a Rua Pará apresentava apenas ruas com nomes de Estados do Brasil. Já na Vila Emil, os nomes de rua do lote em questão são (supostamente) de antigos funcionários da Olaria Ludolf & Ludolf, onde a grande maioria das ruas é denominada sem sobrenome.

Um exemplo que demonstra a boa relação da comunidade com sua rua e a própria história é o que ocorre com a antiga Rua Uruguai, situada em uma área de encosta onde existia boa parte dos laranjais do 5º Distrito. Por ocasião da configuração do abairramento já no novo Município de Mesquita, esse trecho que gerava controvérsia em ser ou não pertencente ao Centro, foi desmembrado formando ali um novo bairro chamado de Alto Uruguai. O detalhe é  que exatamente a rua que inspirou a nova nomenclatura recebeu há algum tempo o nome de Edson show, sem nenhuma consulta prévia à comunidade, ainda que homenageando o compositor que inclusive era  morador daquela rua. Mais uma vez, uma figura relevante na cultura local é homenageada sem que sejam tomados os devidos cuidados quanto ao desejo da comunidade.

Tanto Romildo quanto Edson Show, passando por Roque da Paraiba - outro artista local contemplado como rua renomeada – não causaram prejuízos relevantes quanto a nomenclatura anterior das ruas. Há situações mais complicadas como é o caso da Rua Emilio Guadagne, que anteriormente era chamada de Rua da Sabedoria e em maio de 2008 teve seu nome trocado para José Montes Paixão. 

Memória é trazer verdades históricas para os nossos dias, o que pode ser feito com uma canção oi mesmo uma ação de governo compromissada e focada. Ainda assim, a vontade da comunidade pode e deve ser considerada, de modo a nossa cultura flua sem impedimentos e com a menor quantidade de equívocos possível.

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 Veja mais em:
Nossas Ruas Têm História

http://www.mesquita.rj.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2396:exposicao-nossas-ruas-&catid=62:cgp&Itemid=391

http://www.mesquita.rj.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=2374:lancamento-foi-um-sucesso&catid=62:cgp&Itemid=391

http://www.mesquita.rj.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=1803:rua-ambrosio&catid=213:nossas-ruas-tem-historia&Itemid=479